A Bússola Moral Giratória De Richard Dawkins
Richard Dawkins(1) afirma se opor à eugenia, mas defende o aborto para evitar defeitos congênitos. Dawkins defendeu a eugenia no passado.
No outono passado, a BBC exibiu um documentário de duas partes, esplêndido e ao mesmo tempo arrepiante, intitulado Eugenia: O Maior Escândalo da Ciência. Apresentando detalhes dolorosos, o documentário conta histórias de crianças retiradas a força das ruas e trancafiadas em asilos pelo resto de suas vidas porque eram consideradas imperfeitas; de reclusas em asilos que tiveram seus bebês abortados à força porque foram consideras pelos médicos como mentalmente incapazes e da terrível desvalorização da vida humana que emergiu das políticas de eugenia, tendo como pioneiros Sir Francis Galton, que se inspirou no trabalho de seu primo, Charles Darwin.
A eugenia, praticada muito mais amplamente na Grã-Bretanha e na América do Norte do que se imagina, era a ideia de que a criação seletiva de seres humanos poderia produzir uma espécie melhor. Isso poderia ser feito assegurando que as melhores amostras produzissem muitas crianças e, inversamente, certificando-se de que aquelas consideradas menos perfeitas não poderiam ('eugenia' é a palavra grega para "bom nascimento"). Essas práticas, compreensivelmente, caíram em desuso quando o Terceiro Reich as implementou em escala estatal e as acrescentou a práticas que vão desde o extermínio em larga escala à esterilização forçada. É um fato pouco mencionado que Sir Francis Galton propôs pela primeira vez a idéia de campos de concentração beneficentes, como um local para alojar populações de pessoas consideradas inadequadas para reprodução.
Para minha surpresa, o documentário da BBC também abordou o fato do aborto está sendo usado como uma nova ferramenta eugênica contra a grande maioria das crianças diagnosticadas com Síndrome de Down que estão sendo mortas, ainda útero de suas mães, antes de verem a luz do dia. Galton caiu em desuso, mas seu espírito vive nas clínicas de aborto de Marie Stopes em todo o Reino Unido que, aliás, também era uma eugenista radical e racista virulenta. Felizmente para ela, os ativistas do aborto são insensíveis quando se trata de destruir a cultura, pois seus legados são simplesmente importantes demais para serem deixados de lado.
Por alguma estranha razão, o famoso anti-teísta e autor de "Deus: Um Delírio", Richard Dawkins, decidiu ressuscitar o debate sobre a eugenia neste fim de semana, twittando em 16 de fevereiro que "Uma coisa é lamentar a eugenia por razões ideológicas, políticas e morais. Outra coisa é concluir que não funcionaria na prática. Claro que funciona. Funciona para vacas, cavalos, porcos, cães e rosas. Por que diabos não funcionaria para humanos? Os fatos ignoram a ideologia."
Quando a indignação começou a se espalhar por toda a Twitteresfera, ele acrescentou alguns esclarecimentos precipitados: "Para aqueles que estão determinados a não entender, lamento a idéia de uma política eugênica. Eu simplesmente disse que lamentar tal coisa não significa que não pudesse funcionar. Assim como criamos vacas para produzir mais leite, poderíamos criar seres humanos para correr mais rápido ou pular mais alto. Mas os céus proíbem que façamos isso."
Os céus proíbem de fato. Parece que até um ateu deve apelar para um poder superior quando quer condenar algo hediondo. "Uma política eugênica seria ruim", continuou Dawkins. "Estou combatendo o passo ilógico de que 'se X é ruim, logo X é impossível'. Funcionaria no mesmo sentido que funciona para vacas. Lutemos por razões morais. Negar fatos científicos & perdermos ou, na melhor das hipóteses, prejudica a argumentação". Ele não explicou por que era tão importante ressuscitar um debate sobre se a criação seletiva de seres humanos funcionaria ou por que ele decidiu fazê-lo.
Há, é claro, uma boa razão para as pessoas ficarem tão indignadas com a afirmação de Dawkins, e isso porque - a despeito de suas contestações - ele emergiu no passado como defensor da eugenia. A certa altura, ele twittou que "não se trata de eugenia usar o aborto para evitar defeitos de nascença. Trata-se de evitar o sofrimento humano". Ele ignorou o fato de que este é um dos principais argumentos que os eugenistas - incluindo os nazistas - usavam para justificar seus assassinatos misericordiosos. A história claramente não é seu ponto forte.
De maneira ainda mais brutal, em 2014, Dawkins respondeu a uma pergunta de um seguidor no Twitter sobre o que fazer se um bebê no útero de sua mãe tiver Síndrome de Down, ao que ele respondeu: "Abortar e tentar novamente", seguido da advertência de que "Seria imoral trazer isso ao mundo se você puder ter a escolha. Por "isso" Dawkins quis dizer o bebê com Síndrome de Down e defendeu vigorosamente sua posição quando ativistas pró-vida reagiram horrorizados. Esse duplo padrão de pensamento vai direto ao cerne do problema: quando um ateu defende que devemos nos opor à eugenia por razões "morais", logo após ter declarado que é imoral não matar seu filho ainda ventre caso ele apresente Síndrome de Down, nos leva compreensivelmente a suspeitar que a bússola moral de Dawkins talvez não seja particularmente confiável.
O fato é que, se alguém acredita que o Céu está vazio, como Dawkins acredita, realmente não há moralidade para guiar nossas ações. O próprio Dawkins prova isso com sua visão repulsiva sobre as pessoas com Síndrome de Down e outras deficiências. Assim, "moral" e "imoral" se tornam, para homens sem Deus como Dawkins, termos arbitrários que podem ser aplicados a práticas que eles não tenham predileção. Dawkins pode dizer que a eugenia é "imoral", mas também diz que é "imoral" não abortar uma criança com Síndrome de Down. O Deus do Céu, de fato, proíbe tal brutalidade, mas Dawkins não se importa - mesmo que por um deslize freudiano ocasional o faça apelar para a autoridade divina. Instintivamente, talvez, até Dawkins perceba que para existir uma lei moral, precisamos ter um legislador - e só então todos os membros da família humana estarão a salvo das bússolas morais giratórias de homens como ele.
Original em inglês: Life Site News
Nota:
(1) Clinton Richard Dawkins FRS (Nairóbi, 26 de março de 1941) é um etólogo - especialidade da biologia que estuda o comportamento animal - biólogo evolutivo e escritor britânico. É fellow emérito do New College da Universidade de Oxford e foi Professor para a Compreensão Pública da Ciência, na mesma universidade, entre 1995 e 2008. Dawkins ganhou destaque com o seu livro O Gene Egoísta, de 1976, que popularizou a visão da evolução centrada nos genes e introduziu o termo meme. Em 1982, ele introduziu, na biologia evolutiva, a ideia de fenótipo estendido - segundo a qual, os efeitos fenotípicos de um gene não são necessariamente limitados ao corpo de um organismo, mas podem ampliar-se também ao meio ambiente, incluindo os corpos de outros organismos. Esse conceito é apresentado em seu livro O Fenótipo Estendido. Dawkins é ateu declarado, vice-presidente da Associação Humanista Britânica e defensor do Movimento bright (inteligente). Ele é bem conhecido por suas críticas ao criacionismo e ao design inteligente. Em seu livro O Relojoeiro Cego, de 1986, critica a analogia do relojoeiro, um argumento para a existência de um criador sobrenatural baseado na complexidade dos organismos vivos. Em vez disso, ele descreve os processos evolutivos como análogos a um "relojoeiro cego". Ele já escreveu vários livros de divulgação científica e faz aparições regulares na televisão e no rádio, principalmente para discutir esses temas. Em seu livro The God Delusion (Deus, um Delírio no Brasil e A Desilusão de Deus em Portugal), de 2006, Dawkins afirma que um criador sobrenatural quase certamente não existe e que a fé religiosa é uma ilusão - "uma crença falsa e fixa". Até janeiro de 2010, a versão em inglês do livro havia vendido mais de dois milhões de cópias e havia sido traduzida para 31 idiomas.
Movimento bright: O movimento bright foi iniciado por Paul Geisert e Mynga Futrell em 2003 com o intuito de oferecer um termo que tivesse conotação positiva ao descrever os vários tipos de pessoas que têm uma visão de mundo naturalista, ao mesmo tempo evitando conotações negativas ou anti-religiosas (como as têm os termos ateísta, infiel ou descrente). Decidiram-se por usar o adjetivo inglês bright como um substantivo, dando-lhe um novo significado. O bright é uma pessoa cuja visão do mundo é naturalista - livre de elementos místicos e sobrenaturais. A ética e as ações do bright se baseiam numa visão naturalista do mundo. Um movimento diferente que pretende unir uma variedade de filosofias incluindo ateísmo, deísmo, agnosticismo, panteísmo e Pandeísmo defende o uso do termo "Universismo"